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#Destaques | 08/02/2017

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Foto / Divulgação

 

Na semana passada, a CUT participou de seminário promovido  pela Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), em Brasília, para tratar dos impactos da Reforma Trabalhista. Proposto pelo governo ilegítimo do presidente Michel Temer (PMDB), o Projeto de Lei 6787/2016 já está tramitando no Congresso Nacional.

 

Convidado para abrir o seminário da Abrat, o advogado trabalhista Luis Carlos Moro conversou com a CUT e fez uma avaliação sobre o momento que o país passa. Para ele, a crise institucional entre os poderes deverá se agravar, sobrando para a classe trabalhadora as nefastas decisões de cortar no osso as políticas públicas sociais, “o objetivo está muito claro e existe, hoje, uma ambiência no Congresso Nacional que permite que esses projetos tenham sequência.”

 

Luis Carlos, que carrega no sobrenome e na profissão o inevitável comparativo com o outro Moro, o Sérgio, é ainda secretário geral da Associação Americana de Juristas, um organismo com assento na ONU em Nova Iorque e Genebra. Militante do movimento ativo de advogados, ele acredita que as reformas propostas pelo Executivo representam a ânsia patronal que por alguns anos vinha sendo contida. O advogado acredita que estamos passando por um gravíssimo problema e que alterações na Constituição deveriam ser proibidas: “vivemos, hoje, um período de transição em busca de uma normalidade democrática. E, numa situação dessas, não me parece responsável que tenhamos emendas constitucionais”, concluiu.

 

 

Acompanhe a entrevista:

 

CUT – Ao falar sobre a Reforma Trabalhista, o senhor utilizou uma expressão que parece se encaixar perfeitamente na forma como foi apresentado à sociedade o Projeto de Lei 6787/2016, que trata dessa reforma, encaminhada pelo Executivo no apagar das luzes do calendário legislativo: malandragem!

 

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Foto / Luis Carlos Moro/Arquivo TRT4

 

 

Luis Carlos Moro – Disse isso porque esse é um projeto que foi feito de modo açodado, feito com o propósito de criar um factóide político para tentar dizer à sociedade e, especialmente, a uma fração da sociedade que espera desse governo medidas de restrição dos direitos trabalhistas e que não via nada palpável.

 

O que esse governo fez? Pegou aquele acervo muito parecido com o que apresentei, fez uma espécie de consolidação de todas as propostas patronais e transformou isso na chamada Reforma Trabalhista. Ou seja, são ideias anacrônicas, algumas do milênio anterior, outras da década passada, recuperadas e consolidadas num só projeto que está associado a um Projeto de Emenda à Constituição (PEC), constituindo um panorama muito ruim para negociar o “menos” ruim.

 

E quando eu falo em malandragens, eu digo que há, nesses projetos, pequeninas inserções de instituição de determinadas benesses aos empreendedores, às empresas, principalmente as grandes, por via avessa, transversa. Eles abrem uma exceção para estabelecer uma outra regra, que é mais grave. Esse é o caso do critério da dupla visita para autuação trabalhista, por exemplo. Hoje, no Brasil, a auditoria fiscal do trabalho incomoda porque a fiscalização no país é absolutamente desrespeitada. Você não precisa andar mais que um quarteirão, em qualquer ambiente urbano, para achar uma violação de lei trabalhista. E, a partir do momento em que você passar a ter de ir duas vezes ao local, reduz pela metade a capacidade do auditor autuar. E eles já são pouquíssimos em nosso território diante do volume de desrespeito à lei. Então essa reforma é um mecanismo de impedir a eficiência desse trabalho tão importante.

 

 

 

 

CUT – Agora, existem outras pegadinhas nesse PL 6787/2016. À época em que foi apresentado, no final do ano passado, nem ministros e nem técnicos conseguiram explicar seu conteúdo.

 

 

Moro – A impressão que tenho é que eles não sabiam o que estavam fazendo! Assessores tiveram o trabalho de consolidar aquelas ideias que estavam esparsas nos projetos anteriores, juntaram tudo num pacote fechado e embalado para eles – ministros – que não sabiam o que tinha dentro. Então, no momento em que eles se abrem para a imprensa, eles queriam fazer uma comunicação unilateral e festiva. Eles não estavam dispostos a dialogar, pois não tinham condição técnica de fazer isso. Eles não sabiam o que o pacote continha.

 

 

CUT – Ou seja, abre a possibilidade de 12 horas de trabalho diário? Isso está escrito no PL?

 

 

Moro – Sim, está lá: 10 horas diárias e 44 horas semanais, com a possibilidade de horas extras excedendo aquela jornada.

 

 

CUT – Outro detalhe relevante é que os deputados federais que sugerem as propostas são majoritariamente do PMDB ou do PSDB e são patrões! Ou seja, devem aprovar esse PL às pressas porque temos hoje um Congresso absolutamente patronal. O que esperar em uma próxima eleição?

 

 

Moro – Ninguém se deu conta de que o voto popular de Presidente da República – que é talvez o único voto não maculado pelo financiamento de campanha –, foi afastado. Enquanto os votos proporcionais (para deputados estaduais e federais, senadores, vereadores), em que o poder econômico atua com muito mais intensidade, esses foram preservados e isso tem o propósito evidente de deslocar a questão do Poder Executivo para o Legislativo, que está tentando retomar um protagonismo que perdeu há muito tempo e que ele só ganha quando usa uma lógica de sequestrador político, de chantagem: eu não voto esse projeto que para você é essencial, se não houver em contrapartida isso, isso e isso, para atender meus interesses e dos meus financiadores.

 

Então nós temos hoje uma democracia não só atacada, como reconhecido por julgado do Supremo Tribunal Federal (STF), como também distorcida no que diz respeito à representação popular. Esse Congresso e o governo provisório, precário, vieram de um processo de impedimento de uma presidente da República eleita, com tantos e tão graves problemas, para não usar a expressão que eles não gostam, pois eu não quero me ver vítima de qualquer golpe de reação ao que eu disser.

 

 

CUT – O senhor falou, ainda, da relação do juiz do Trabalho que está sendo sutilmente imposta nas entrelinhas do PL 6787/16.

 

 

Moro – Esse é um processo que já está em curso tem tempo. Nós já temos hoje uma preponderância muito grande da cúpula do Judiciário sobre a base. Não só por meio de edição das Súmulas Vinculantes do Supremo, da avocação de temas com, inclusive, a suspensão do andamento de processos de determinados temas. O ramo dos bancários, por exemplo, acaba de sofrer derrota importantíssima no Tribunal Superior do Trabalho (TST), por meio desse mecanismo de afetação de um tema para que se resolva um conjunto de processos. Isso, na verdade, implica em suprimir do juiz uma parcela do seu poder. Expressam-se, então, os ministros em nome dos juízes.

 

Estamos, portanto, invertendo a ordem lógica do Judiciário, que vai se pronunciar pela cúpula, que tem proferido decisões previamente à base, com edição de instruções normativas ou súmulas de jurisprudência antes que ela se forme num processo normal, como era no período de decantação das idéias. Ou seja, temos um déficit democrático que é maior do que se imagina. Ele atinge o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

 

 

CUT – Existe, sim, uma crise entre os poderes, então?

 

 

Moro – Gravíssima! E mais do que isso. Aquele que funcionaria como um moderador disso tudo, que tem uma atuação extremamente importante em fiscalização da ordem jurídica, hoje se revela grandemente a despeito de seus méritos, como um órgão de classe, que é o Ministério Público. Com nobres e maravilhosas exceções, a cúpula o Ministério Público se manifesta como um grande chancelador disso tudo que estamos vivendo.

 

 

CUT – Essa proposta de texto da Reforma da Previdência que foi encaminhada ao Congresso deve ser extinta e discutida com a sociedade sob outro formato?

 

 

Moro – Essa PEC da Previdência, para sintetizar, é uma proposta de redistribuição alocativa de recursos públicos e privados, tirando do povo e entregando para o sistema financeiro. É uma proposta de promoção do sistema previdenciário privado e de expulsão da população protegida pela previdência pública. Não é uma proposta de adequação dos cofres da previdência, mas sim dos bancos que irão apostar na previdência privada.

 

 

 

Fonte: Luciana Waclawovsky – CUT Nacional

Fontes:

Publicado em:08/02/2017

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