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#Notícias | 05/09/2019

 

O anúncio da intenção do governo Bolsonaro de reduzir em 90% as Normas Regulamentadores (NRs) de Segurança e Saúde no Trabalho mobilizou entidades representativas dos trabalhadores em audiência pública da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, realizada na manhã desta quarta-feira (4), em Porto Alegre.

 

Para os participantes da audiência, proposta pelo deputado Valdeci Oliveira (PT) por solicitação do Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST), a decisão significa um retrocesso que poderá resultar na multiplicação do número de acidentes de trabalho e mortes.

 

Na próxima reunião ordinária da Comissão de Saúde e Meio Ambiente, Valdeci, junto com o deputado Pepe Vargas (PT), também presente à audiência, buscará o apoio dos demais membros do grupo técnico para pedir que o governo federal amplie o prazo da consulta pública aberta sobre o tema.

 

“Não bastasse a retirada de direitos sociais por meio da terceirização sem limites e da destruição da legislação trabalhista e da Previdência, o governo Bolsonaro agora busca reduzir em 90% as normas que dão segurança e garantem a saúde da classe trabalhadora”, disse Valdeci. “E faz isso com o argumento de que é para gerar mais empregos e que as normas são hostis às empresas”, completou.

 

Conforme o parlamentar, as NRs atualmente em vigor são resultantes de discussões tripartites que envolveram representantes do governo, dos trabalhadores e da classe empresarial, seguindo o disposto nas normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Elas regulamentam e disciplinam, por exemplo, procedimentos que devem ser seguidos para garantir a segurança e integridade física de quem trabalha em atividades cuja periculosidade pode oferecer riscos graves”, explicou o deputado.

 

 

4,5 milhões de acidentes de trabalho entre 2012 e 2018

 

Mesmo com as NRs, conforme manifesto elaborado por um conjunto de entidades sindicais, no período de 2012 a 2018, foram registrados 4,5 milhões de acidentes de trabalho no país, um a cada 49 segundos, que resultaram em 16 mil mortes e mais de 38 mil amputações, isto é, uma morte por acidente de trabalho a cada três horas e quarenta e três minutos, segundo dados oficiais do Ministério Público do Trabalho.

 

Ainda conforme o documento, lido e distribuído durante a audiência, no mesmo período, R$ 79 bilhões foram gastos pela Previdência Social na cobertura de benefícios acidentários, além de terem sido perdidos 350 mil dias de trabalho devido a acidentes, sem se falar nos casos não notificados.

 

Representando o Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador, Gerson Cardoso manifestou a preocupação dos trabalhadores com os impactos das alterações propostas. Para ele, a redução drástica de normas resultará na precarização dos locais de trabalho, no aumento do número e da gravidade dos acidentes, em mais gastos e mais mortes. “As NRs salvam vidas”, defendeu, reforçando os dizeres expostos em cartazes no local da audiência.

 

Ele defendeu que houvesse mais tempo para debate sobre o tema com a sociedade, “no mínimo, 180 dias”, além de debates técnicos na Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP) e audiências públicas chamadas pela CTPP em conjunto com os parlamentos da cada unidade da federação.

 

 

Brasil, de campeão para 4º lugar em acidentes de trabalho

 

A auditora Heloísa Rubenich, da Associação Gaúcha dos Auditores Fiscais do Trabalho (Agitra), contou que na década de 70 o Brasil era o campeão em acidentes de trabalho no mundo, o que levou o governo da época, por pressão de organismos internacionais, a criar as normas reguladoras. Hoje o país estava em quarto lugar no ranking mundial, o que indicava, segundo ela, que ainda havia muito por fazer. De 2014 a 2018, foram registrados 1,8 milhão de acidentes de trabalho, resultando em 6,2 mil mortes, informou.

 

Em 1978, ainda segundo ela, o governo lançou uma portaria contendo inicialmente 28 normas. De lá para cá, diante de novas formas de trabalho, outras normas foram acrescidas, como as do setor portuário, da pesca, de estabelecimentos de saúde, espaços confinados, trabalho em altura, abate de carnes e derivados e plataformas de petróleo.

 

Além dos índices oficiais elevados, existiam, segundo a auditora fiscal, as subnotificações de acidentes. Ela citou estudo de colega seu – auditor fiscal do Trabalho – realizado junto com o Ministério Público do Trabalho, segundo o qual o número real de mortes por causas laborais era quatro vezes maior do que os números oficiais da previdência.

 

Entre 2011 e 2016, segundo ela, houve apenas 40 registros de doenças causadas por poeiras ou agentes químicos no Rio Grande do Sul, por exemplo. “Não aparecem nos dados oficiais”, disse. “São invisíveis”, afirmou, observando ainda que enquanto aqui (no Brasil) falavam de acidentes violentos, com mutilações, na União Europeia era o câncer a primeira causa de mortalidade relacionada ao trabalho.

 

Segundo a técnica, o estudo foi baseado em dados da Secretaria de Segurança Pública, no Diagnóstico de Acidentabilidade Fatal no Trânsito e na base de dados da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego. Conforme ela, morre-se mais no trabalho do que no trânsito ou por latrocínio e homicídio. “São muitos trabalhadores perdendo a vida e não podemos compactuar com esse retrocesso que está ocorrendo”, disse.

 

Ela também reportou ameaças que os auditores fiscais vinham sofrendo no exercício de suas atividades, como o que havia ocorrido no dia de hoje quando colegas de Pernambuco foram impedidos por barricadas de realizarem inspeção.

 

 

Situação é muito grave

 

O deputado Pepe Vargas (PT) considerou muito grave a situação relatada. “Temos um histórico bastante complicado e nada recomendável, como foi demonstrado aqui”, disse. “Éramos campões mundiais e, depois de muito esforço, muita luta, caímos um pouco, mas ainda temos estatísticas muito graves nessa área, sem falar da subnotificação histórica”, continuou.

 

“Qualquer dirigente de sindicato, em especial aqueles que atuam em setores de segurança e saúde do trabalho, sabe o quanto é comum procurar o sindicato porque não foi emitida a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) e tem uma doença relacionada ao trabalho, com nexo causal evidente, mas não tem acesso aos exames complementares para poder estabelecer esse nexo causal”, disse.

 

O deputado salientou que também era muito grave o relato de ameaças e coação sofridas pelos auditores fiscais e disse que o episódio o fez lembrar do ocorrido em Minas Gerais em 2004, quando três auditores do trabalho foram assassinados, assim como o motorista. “Com esse discurso da simplificação, da desburocratização, da modernização, muitos crimes estão sendo cometidos no nosso país”, disse. “Não vou falar de maldade, é crime mesmo”, completou.

 

Mudanças ameaçam fiscalização do trabalho

 

Falando especificamente sobre a NR 3, que afeta diretamente a sua atividade de auditor fiscal do trabalho, Lúcio Debarba foi categórico quanto aos danos que as mudanças propostas causariam. Ele disse que era um dos “poucos corajosos que ainda conseguiam entrar em uma fábrica e interditar uma linha de produção” e que a “matriz de risco” que se pretendia incluir inviabilizaria a sua atividade. Falou ainda que a responsabilidade da análise de risco tinha que ser do empregador e que se passasse para o fiscal este não teria elementos para tomar uma decisão.

 

“Querem acabar com o nosso trabalho. Vão se multiplicar os acidentes de trabalho e não vai ter um fiscal, dos poucos que ainda entram no chão de fábrica, porque a maioria não tem coragem de entrar, prefere pedir um monte de documentos e analisá-los sob o ar-condicionado”, disse.

 

O presidente da CUT-RS, Claudir Nespolo, afirmou que está preocupado com o desmonte das NRs, pois são medidas que já salvaram a vida de milhões de trabalhadores e trabalhadoras no Brasil.

 

 

Loricardo de Oliveira, secretário-geral da Confederação Nacional dos Metalúrgicos e integrante da CTPP, disse que as normas reguladoras haviam sido uma exigência do Banco Mundial em 1978, “porque morreu muita gente em Itaipu, por exemplo”. Ele também mencionou a criação das comissões tripartites e disse que em dezembro do ano passado, na última reunião realizada em Brasília, aprovaram de forma unânime – da parte dos trabalhadores, da classe empresarial e do governo – que a comissão não podia ser extinta porque vinha de uma convenção ratificada.

 

Também a chefe de Divisão do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, Andréia Gnoatto, manifestou preocupação com a revisão das normas e a forma acelerada adotada no processo. Disse concordar com a necessidade de se realizar um debate mais aprofundado.

 

Representando a secretária estadual de Trabalho e Assistência Social, o presidente do FGTAS, Rogério Grade, também destacou a relevância do tema e o quanto ele vinha afetando famílias e disse que entregaria o manifesto à secretária.

 

Fonte: CUT-RS com Marinella Peruzzo – Assembleia Legislativa

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Publicado em:05/09/2019

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