#Notícias | 02/06/2020
Usando a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) como pretexto, o Governo Federal mais uma vez apresentou uma nova Medida Provisória (MP) propondo retirar direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras e, claro, favorecer os patrões. É a MP nº 927 que tem validade até 20 de julho deste ano, e deverá ser votada pela Câmara dos Deputados. A data da votação ainda não foi definida, mas, nos bastidores, fala-se que pode ser esta semana.
Bolsonaro, desta vez, quer mexer no seu direito a férias, no banco de horas, no pagamento de horas extras e retirar direitos previamente estabelecidos em acordos coletivos, além de mexer nos direitos dos profissionais de saúde que estão na linha de frente no combate à pandemia, arriscando a própria vida para salvar outras.
A MP também prevê que patrão e trabalhador celebrem acordo individual abrindo mão de direitos, sem a participação de sindicatos, tais como teletrabalho, antecipação de férias sem direito ao pagamento antecipado de 1/3, antecipação de feriados com longo prazo para compensação, banco de horas também com longo prazo para compensação, até 2022, prorrogação de jornada e outras restrições de direitos.
Provocar ainda mais perdas para os trabalhadores e trabalhadoras é algo impensável neste momento de pandemia e, por isso a CUT continuará o trabalho conjunto que vem fazendo com outras centrais sindicais, Ministério Público do Trabalho (MPT), Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) e outras entidades, por meio do Fórum Interinstitucional de Defesa do Direito do Trabalho e da Previdência (FIDS) lutando pela rejeição desta MP.
“Temos dialogado com parlamentares e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, demonstrando que esta MP é inoportuna e um retrocesso. É hora de intensificar a pressão online, por causa do isolamento social necessário, sobre os parlamentares nos estados para impedirmos mais este absurdo”, diz o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle.
Todas as medidas contidas na MP são nitidamente prejudiciais ao trabalhador e favorece o patrão porque na concepção do governo é o empresariado que mantém a economia e, por isso, Bolsonaro abre um leque de possibilidades de soluções para vários setores da economia, afirma o advogado do escritório LBS, Fernando José Hirsch.
“O empresário pode dar férias, utilizar o banco de horas negativo, não pagar hora extra em teletrabalho, suspender contratos, reduzir jornadas e salários. Ou seja, tem um menu de opções que ele pode utilizar de acordo com a sua necessidade”, diz Hirsch, se referindo a MP nº 927 e outras já aprovadas como a MP nº 936.
Uma das mudanças na legislação trabalhista contida na MP 927 é em relação a direito às férias. Com a MP, as férias podem ser comunicadas com até 48 horas antes de seu início (em vez de 30 dias), tendo o pagamento fatiado e adiado. O valor poderá ser pago no mês subsequente (e não dois dias antes, como previsto na CLT) e o correspondente ao terço poderá ser pago até 20 de dezembro de 2020.
Os profissionais de saúde podem ter suas férias suspensas, mesmo que em curso. A empresa pode convocar o trabalhador e a trabalhadora para comparecer ao serviço, desde que comunique a exigência com 48 horas de antecedência.
As novas regras também dispensam a participação do sindicato das categorias em todo o processo relativo à concessão de férias, ainda que coletivas.
“A MP tira do sindicato, a última esfera de poder negocial do empregado, em meio ao desespero pela manutenção de empregos, e só resta apenas o ‘sim’, o aceite de qualquer coisa”, analisam em artigo Lais Lima Muylaert Carrano e Luara Borges Dias, advogadas do LBS.
Os profissionais de saúde, além dos prejuízos em relação às férias poderão ter menos tempo de descanso. A MP permite que seja menor o período entre o fim de uma jornada e o início de outra, hoje estabelecida em 11 horas. Com isso, o trabalhador corre o risco de não ter respeitado o descanso de um dia para o outro, sem que a empresa seja autuada por isso.
Outra benesse aos patrões é o direito de pagar aos profissionais da saúde horas extras ou não. Ele pode trabalhar 16 horas diariamente, mesmo com a CLT determinando, no máximo, duas horas diárias de extras, que a empresa poderá oferecer folgas em troca da hora extra, por um período de 18 meses.
“Pela ótica da empresa que não está conseguindo contratar médicos e enfermeiros, com o quadro reduzido, quem pode trabalhar, trabalha dobrado sem receber horas extras e quando acabar a pandemia, esse profissional vai tirar folgas semanais ou mensais, o que for melhor para o empregador, e o trabalhador não receberá nada em termos financeiros por ter colocado a sua vida em risco. Tudo é feito para não onerar a empresa”, diz Hirsch.
Na Medida Provisória, Bolsonaro retirou o direito do pagamento de horas extras também para quem é colocado em teletrabalho. Se aproveitando da reforma Trabalhista, que diz que quem exerce a profissão em casa, tem “liberdade de horário”, e não recebe hora extra, ele incluiu no mesmo balaio os trabalhadores que foram obrigados a exercer suas atividades em casa, sem que houvesse um contrato prévio para isso.
A MP estabelece que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo.
“Isto significa que o patrão, que já pode controlar a jornada remotamente, pode também marcar uma reunião online a noite, deixar o trabalhador de plantão das cinco da manhã às dez da noite esperando pelo retorno de um cliente, e este tempo não é computado como hora extra”, critica o advogado Fernando Hirsch.
A MP também permite o banco de horas negativo. O trabalhador que não consegue exercer sua atividade em casa, mas não foi demitido terá de pagar as horas inativas quando voltar ao trabalho.
“Um trabalhador do grupo de risco, que não está trabalhando pela sua condição de saúde ou em decorrência do fechamento momentâneo da empresa, poderá fazer horas extras por longos períodos para pagar o tempo inativo. O mesmo em relação a qualquer trabalhador que tenha contrato de 8 horas diárias, e está trabalhando seis horas. Ele poderá ter de trabalhar 10 horas diariamente para compensar as duas horas que a empresa o dispensou. É o chamado banco de horas negativo”, explica o advogado do LBS.
Veja quais direitos a MP nº 927 retira
- Possibilita a redução da indenização devida aos trabalhadores em caso de demissão sob a alegação de força maior decorrente da calamidade pública provocada pela Covid-19.
- Possibilita que empregado e o empregador celebrarem acordo individual abrindo mão de direitos, sem a participação de sindicatos.
- Suspensão de exames médicos ocupacionais.
- Limita a atuação da Fiscalização do Trabalho, com a ampliação das regras sobre dupla visita e impedimento de que autuem empresas infratoras, A MP 927 propõe é virtualmente a suspensão da própria fiscalização do trabalho por 180 dias, salvo no caso das limitadíssimas situações previstas.
- Prorroga contratos coletivos que venham a vencer no período da calamidade, sem a negociação com os sindicados.
- Na forma proposta, quaisquer medidas, ainda que contrárias a outros dispositivos da CLT, mas não à própria MP, poderiam ser consideradas válidas.
Fonte: Luiz Alberto dos Santos – Advogado – Consultor Legislativo do Senado Federal
Supremo impede mais retirada de direito
Bolsonaro queria ainda tirar mais direitos dos trabalhadores com a MP nº 927. Inicialmente estava previsto que trabalhador que contraísse a Covid 19 teria de provar que a doença foi originária das condições de trabalho para ter direitos ao auxílio-doença, por exemplo. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a medida é ilegal e o artigo 29 da MP foi retirado pelo governo.
O STF também decidiu pela inconstitucionalidade do artigo 31, que impedia a fiscalização de auditores fiscais do trabalho. As empresas poderiam burlar a lei como quisessem, já que a MP proibia a fiscalização trabalhista, durante o período de calamidade pública.
Relator da MP tenta tirar mais direitos dos trabalhadores
O relator da MP 927 na Câmara Federal, deputado Celso Maldaner (MDB-SC) tentou incluir na Medida Provisória a redução da multa referente ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) na hora da demissão do trabalhador de 40% para 20%.
No entanto, essa medida estava contida na MP 905, da Carteira Verde e Amarela, que foi retirada pelo governo porque o Congresso Nacional dava sinais de que ela seria rejeitada. Pela legislação quando uma MP não é aprovada, seu conteúdo não pode ser colocado em votação em outra MP, no mesmo ano.
Foi mantido o texto original que prevê que a empresa pode suspender o recolhimento do FGTS referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente. Mas, se o trabalhador for demitido, ele terá direito ao recolhimento referente a esses meses.
Segundo o advogado e consultor Legislativo do Senado Federal, Luiz Alberto Santos, a repercussão negativa fez com que o Maldaner, retirasse do relatório, essa possibilidade. Além disso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que proibiria que qualquer “jabuti”, como chamam os itens alheios à MP, fossem incluídos durante a votação.
De acordo com o consultor legislativo, o relator na Câmara dos Deputados, além de não acolher praticamente nenhuma das 1.082 emendas apresentadas previamente ao exame do Plenário, ignora esses limites e “ressuscita” diversos dispositivos constantes quer da MPV 905, que a pretexto de dispor sobre a geração de empregos para jovens com a criação do Contrato Verde e Amarelo promoveu uma nova “Reforma Trabalhista” derrubando mais de 130 dispositivos da CLT e vulnerando direitos dos trabalhadores.
O consultor legislativo fez uma análise comparativa entre as MPs 927 e 905, das emendas rejeitadas e uma lista dos 49 itens de direitos retirados pelo relator da MP 927.
Notas de repúdio ao relatório da MP 927
Entidades de juízes, auditores fiscais do trabalho e de direitos do trabalhador emitiram nota de repúdio ao relatório preliminar da MP 927. As críticas foram feitas pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sinait ) e pelo Fórum Interinstitucional de Defesa do Direito do Trabalho e da Previdência (FIDS), integrado por entidades de representação do mundo do trabalho e do campo social, organizações de trabalhadores, professores e pesquisadores.
Fonte: CUT Brasil