Escrito por

#Destaques | 27/04/2018

A reforma trabalhista do governo ilegítimo Temer, ou mais precisamente a antirreforma que praticamente estraçalhou com a CLT por determinação das poderosas confederações patronais brasileiras, será a principal responsável pelo aumento dos acidentes e mortes no mundo do trabalho a partir de agora no Brasil. Essa foi a conclusão a que se chegou durante o seminário realizado pelo Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST) na manhã desta quinta (26), no auditório do Sindicato dos Metalúrgicos de Porto Alegre.

 

Reunindo nomes íntima e profissionalmente ligados a questões trabalhistas, o encontro esteve inserido dentro das atividades alusivas ao Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho, que ocorre no próximo sábado (28).

 

A mesa do seminário foi integrada pelo vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), desembargador Ricardo Fraga, pelo médico do Trabalho, Rogério Dornelles, pelo auditor fiscal do Ministério do Trabalho, Mauro Müller, e pelo advogado trabalhista Lauro Magnago.

 

Golpe veio para destruir políticas públicas e direitos dos trabalhadores

 

A secretária de Administração e Finanças da CUT-RS, Vitalina Gonçalves, lembrou que o “golpe que atinge o nosso país foi arquitetado com vistas a destruir as políticas públicas e os direitos dos trabalhadores”. Para ela, isso ficou muito claro quando da votação da PEC 55, que congelou por 20 anos os investimentos públicos em saúde e educação.

 

Foto: Reprodução/CUT

Foto: Reprodução/CUT

 

“Em seguida vieram as reforma trabalhista e o sucateamento dessas mesmas áreas, além da segurança”, disse. “É vital que estejamos nas ruas, na resistência, dialogando com a população, pois a saúde dos trabalhadores é apenas um dos elementos atacados no conjunto da saúde pública”, frisou Vitalina.

 

“O objetivo é claro: entregar mais esse segmento para o capital privado”, disse acrescentando que aquilo que é um direito social conquistado a partir de muita luta e organização da sociedade não deve ser direcionado apenas para o lucro”, salientou a dirigente da CUT-RS.

 

Antirreforma trabalhista e agenda de retrocessos

 

A lei nº 13.467 é uma antirreforma trabalhista, levada a cabo pelas mesmas forças políticas e empresariais que aplicaram o golpe de 2016, derrubando sem crime de responsabilidade a presidenta Dilma Rousseff. Essa legislação traz embutida em seus artigos aquilo que podemos chamar de a perversidade das elites brasileiras, que se negam até mesmo a dividir com o povo as migalhas de seus fabulosos ganhos financeiros, conquistados às custas daqueles que são os verdadeiros responsáveis pela produção da riqueza do nosso país: a classe trabalhadora.

 

Foto: Reprodução/CUT

Foto: Reprodução/CUT

 

E o que torna essa antirreforma ainda mais nociva para a imensa maioria da população é que ela foi feita juntamente com outros retrocessos, que aprofundam ainda mais o fosso entre aqueles que pouco ou nada tem e a parcela mais rica da sociedade: congelamento por 20 anos dos gastos em saúde e educação, aniquilação da política de crescimento real do salário mínimo, reforma do ensino médio, entrega do pré-sal às multinacionais estrangeiras do petróleo, sucateamento (e possível extinção) do SUS, perdão e/ou redução significativa das dívidas da iniciativa privada com o governo (o que gera perda de receita), entre outras iniciativas.

 

Jurisprudência precisa avançar

 

“Nosso compromisso é não permitirmos a desintegração e fragmentação da sociedade”, destacou o desembargador Ricardo Fraga ao lembrar que a atual conjuntura nacional tem mostrado um avanço significativo do fascismo que cotidianamente confronta a Constituição. Para o magistrado, hoje o Direito do Trabalho está sendo insuficiente para dar conta, por exemplo, dos acidentes de trabalho, além de que a jurisprudência precisa avançar na matéria do nexo técnico epidemiológico.

 

Segundo o desembargador, “hoje as bulas de remédio trazem muito mais números estatísticos do que propriamente informações médicas. É preciso que se utilize de mais dados do INSS, é importante não apenas saber se foi ou não um acidente, mas se há ou não uma epidemia”, frisou.

 

Foto: Reprodução/CUT

Foto: Reprodução/CUT

 

Politização judicial

 

Fraga apontou a politização judicial que o jurista italiano Luigi Ferrajoli, um dos expoentes das teorias do garantismo constitucional, analisou. “Estamos diante daquilo que Cesare Beccaria, em ‘Dos delitos e das penas’, chamou ‘processo ofensivo’, onde ‘o juiz’, em vez de ‘indiferente pesquisador do verdadeiro’, “se torna inimigo do réu’.

 

Segundo o desembargador, Ferrajoli também destaca o “inegável nexo que liga os ataques aos dois presidentes artífices do extraordinário progresso social e econômico do Brasil – a falta de base jurídica na destituição de Dilma Rousseff e a campanha judiciária contra Lula – e que faz das suas convergências uma única operação de restauração antidemocrática”.

 

Apesar dos retrocessos sociais, Fraga acredita haver muitas coisas novas e que a roda da história está girando para frente e, por isso mesmo, há reações do outro lado. Como exemplo, ele destacou o questionamento do novo parágrafo único do artigo 611-B da CLT: “regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para fins do disposto neste artigo”.

 

“Os imbecis perderam a modéstia”

 

O advogado trabalhista Lauro Magnago afirmou não estar tão otimista assim, pois hoje, citanto o dramaturgo Nelson Rodrigues, “os imbecis perderam a modéstia”. Segundo ele, “o problema não é debater, discutir ideias; o problema é ter como interlocutores tipos como o MBL, Alexandre Frota e Kim Kataguiri”, contraste este que já chegou ao Direito do Trabalho.

 

Foto: Reprodução/CUT

Foto: Reprodução/CUT

 

“Hoje a CLT foi transformada em um código de direito patronal, que diz o que são os direitos das empresas, onde deveria ser a defesa do trabalhador”, afirmou o advogado, destacando que até mesmo profissionais que não são vinculados à esquerda “ficaram enojados, pois rompeu-se com o patamar civilizatório”.

 

Sem amenizar o conjunto de pontos maléficos ao mundo do trabalho, Magnago mostrou-se preocupado com as medidas vinculadas com a saúde do trabalhador, principalmente àqueles lotados em atividades fabris, como jornada de 12h/36h, intervalo menor, banco de horas e trabalho de gestantes em ambientes insalubres.

 

“Os acidentes e lesões tendem a aumentar. Aqui nós temos um capitalismo burro que reduz o mercado de consumo e uma lei para contrariar as súmulas do TRT. Nossa elite ainda não chegou a um patamar evolutivo”, pontuou.

 

Magnago criticou ainda a dificuldade criada pela nova legislação aos trabalhadores acessarem a justiça. “Além de tirar direitos, agora temos o não-direito de litigar”, frisou, destacando que se antes da nova lei ia-se à Justiça do Trabalho, buscar a reparação devida, com as novas regras havendo sucumbência (rejeição total ou parcial, pelo juiz) é o trabalhador que deverá pagar pelas custas judiciais”, alertou.

 

Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), de número 5766, questionando os dispositivos da antirreforma que afetam gratuidade da justiça, foi liberada para julgamento pelo ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). “É claramente inconstitucional, pois vai contra o artigo 5º da Constituição”, frisou Magnago, lembrando que a Carta Magna garante gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos.

 

“Se nos deixarem litigar, a Justiça do Trabalho não vai chancelar esse absurdo”, opinou o advogado, destacando ser de fundamental importância que os trabalhadores e suas respectivas representações sindicais acompanhem esse assunto.

 

Resgate de promessas

 

“Transformaram os trabalhadores em átomos isolados, cada um deles sendo uma MEI (micro empresa individual). O desejo do empresariado brasileiro é diminuir os encargos e responsabilizar os tomadores de serviços. A médio e longo prazos teremos um cenário desanimador com aumento do adoecimento psicossocial. A cada 10 acidentes de trabalho, 8 são de relações terceirizadas ou quarteirizadas”, denunciou o auditor fiscal Mauro Müller.

 

Foto: Reprodução/CUT

Foto: Reprodução/CUT

 

Ele analisou as promessas, principalmente no caso da terceirização sem limites, feitas pelo governo golpista e representantes da iniciativa privada em defesa da reforma trabalhista. E diante de um contingente de 13 milhões de desempregados, como temos hoje, Müller lembrou que a situação também é preocupante. Em cenários como esse, “o trabalhador tende a não lutar por melhorias das condições de trabalho, mas manter o seu emprego”.

 

O auditor fiscal também apontou como principais preocupações e desafios a serem enfrentados pelos trabalhadores e sindicatos os casos das jornadas prolongadas, trabalho intermitente, teletrabalho e insalubridade das gestantes. Para ele, o que pode parecer uma vantagem num primeiro momento, como uma jornada de 12h por 36h, se torna penosa à saúde quando por longos períodos.

 

“O trabalhador enxerga como uma vantagem, pois pode dobrar a jornada em outro local para buscar alternativas de renda. É preciso desfazer esse pensamento, esclarecer que isso não é recomendável, mais importante é a luta sindical”, disse.

 

O mesmo alerta vale para o trabalho intermitente. Ele usou como o exemplo uma menina que trabalha em uma rede de fast food, onde inicia logo cedo até  as 12h e só retorna às 16h. Nesse meio tempo, por falta de opção e de tempo, essa trabalhadora acaba por ficar no centro e “não consegue organizar a sua vida. O seu descanso, lazer ou estudo ficam tolhidos”. Para ele é preciso denunciar, dialogar socialmente e combater esses descalabros.

 

Igual orientação se aplica para o trabalho insalubre, flexibilizado às gestantes com a antirreforma. Para ele, trata-se de uma excrescência pagar a mais para um trabalhador ou uma trabalhadora diminuir a sua saúde, sendo necessário fazer avançar as ações de prevenção.

 

“É preciso que os sindicatos tenham muita atenção nos acordos e convenções coletivas em cláusulas que impactem a saúde e a segurança dos trabalhadores”, destacou.

 

Já o teletrabalho apresenta dificuldade no âmbito da fiscalização, pois “a lei é simplória e o ambiente é a sua própria casa”, classificou.

 

Müller pediu aos presentes um minuto de silêncio por mais uma morte de trabalhador, a terceira nesse ano, em silos de arroz. “Quando um trabalhador ou trabalhadora perde sua vida, perdemos uma batalha”, concluiu o auditor fiscal.

 

Nexo técnico epidemiológico

 

O médico Rogério Dornelles abordou questões ligadas à medicina praticada dentro das empresas. “Já fizemos diversas CATs (Comunicação de Acidente de Trabalho) e as estatísticas comprovam que há subnotificação. Um exemplo foi dado para exemplificar como se chega ao nexo técnico epidemiológico.

 

Ele usou o seguinte raciocínio: se 10% da população em geral é diagnosticada com alguma doença mental e a categoria bancária chegar ao dobro disso, acrescentando estatísticas do próprio INSS sobre o motivos dos afastamentos por problemas de saúde e estudos e levantamentos médicos, isso se torna nexo técnico epidemiológico.

 

Foto: CUT/Reprodução

Foto: CUT/Reprodução

 

“Sendo assim, o bancário indo até a perícia médica com indicativo de doença mental isso precisa ser visto como doença do trabalho e é a empresa que tem de provar que não se trata disso. Porém, houve movimentos tanto da categoria médica, principalmente aquela que atua dentro das empresas, quanto dos peritos do INSS que afirmavam que desta forma seria tirada a autonomia profissional para fazer tal diagnóstico. Ora, a maioria não olha nem na tua cara, não pegam sequer os exames. Como é que querem fazer um trabalho decente e puxar pra si essa prerrogativa?”, questionou.

 

Por sua vez, os peritos do INSS, em um movimento sorrateiro, começaram a negar a constituição dos nexos. De 250 mil notificações nesse sentido em 2008, passou-se para menos de 150 mil atualmente. “Alguém já viu algum médico do trabalho de empresa ou perito do INSS ser chamado no Conselho Regional de Medicina para dar explicações de o por que negou as CATs que depois a Justiça reconheceu como válidas? Por outro lado, conheço médicos de sindicatos que tiveram de explicar na polícia atestados de três dias para trabalhadores”, afirmou.

 

O médico também criticou a postura da própria Justiça, que nega o reconhecimento de doenças do trabalho mesmo diante de exames que atestam a sua existência. “Essa é a realidade do trabalhador. Temos que que usar a nossa criatividade, escolher como nos governar, usar exemplos nossos, não os de fora.Eu acredito na nossa mobilização, na nossa organização. E por isso prenderam esse cara (Lula), porque era isso que ele estava dizendo para nós”, concluiu

 

Encaminhamento

 

Ao final do encontro,  o coordenador do FSST, Alfredo Gonçalves, anunciou a entrega de um ofício ao Ministério do Trabalho, em Brasília, defendendo a revogação imediata da Instrução Normativa (IN) 142, que foi feita para atender aos anseios do patronato, dificulta a fiscalização e prejudica as ações feitas pelos auditores fiscais do Trabalho.

 

 

Fonte: CUT-RS

Fontes:

Publicado em:27/04/2018

Voltar

Notícias Relacionadas